Estou ainda sob o impacto do terremoto que destruiu o povo haitiano.
Quando se inicia um novo ano, somos naturalmente acometidos por um curioso desejo pelo novo, pelo diferente, pela esperança de que tudo vai estar bem melhor. Ainda vivendo o clima das comemorações pela chegada de 2010, somos surpreendidos por esta tragédia que, por força da tecnologia, parece que foi aqui do lado da nossa casa. O meu sentimento inicial foi de perplexidade, não só diante das cenas aterrorizantes, mas, principalmente pela constatação do quanto aquele povo estava abandonado a ponto de não terem uma forma de se protegerem e, na condição que vive o país, sofrerem inclusive pela difícil condição do país para receber ajuda. Parece até que foi preciso acontecer o cismo para que o mundo olhasse para os abandonados, empobrecidos principalmente pela miséria de consciência social e política dos governantes. O fato parece abrir nossos olhos para o quanto vulneráveis estamos neste mundo, porque além das calaminades naturais provocadas pela natureza revoltada com o descuido diante das questões ambientais, estamos a mercê de políticos que não estão nem aí para as necessidades do povo. Querem mesmo é manter cheios os seus "cofres" pessoais.
Neste momento lembro-me de um poema que Afonso Romano SantAnna publicou nos anos 80, que infelizmente continua atual no nosso país. Ele fala da mentira.
" Mentiram-me.
Mentiram-me ontem
e hoje mentem novamente.
Mentem de corpo e almacompletamente.
e mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente.
Mentem sobretudo impunemente.
Não mentem tristes,
alegremente mentem.
Mentem tão racionalmente
que acho que mentindo história a fora
vão enganar a morte eternamente.
Mentem, mentem e calam
...
Sei que a verdade é difícil e para alguns é cara e escura,
mas não se chega á verdade pela mentira
nem a democracia pela ditadura
...
Mentem, mentem caricaturalmente.
mentem como a careca mente ao pente,
mentem como a dentadura mente ao dente,
mentem como a carroça á besta em frente,
mentem como a doença ao doente,
mentem como o espelho transparente
...
Mentem partidariamente,
mentem incrivelmente,
mentem tropicalmente,
mentem hereditariamente,
mentem, mentem e de tanto mentir tão bravamente
constróem um país de mentiras diariamente."